Quantos filmes assistimos nos quais o protagonista tem a chance de voltar no tempo e corrigir algum erro do passado? Inúmeros, sem dúvida. As histórias nos emocionam, independentemente do gênero do filme, e acredito que isso se deva, em grande parte, porque muitos de nós temos questões mal resolvidas e gostaríamos de poder voltar no tempo para ajustar algo. Eu, por exemplo, gostaria.
Gostaria de voltar à minha infância e dizer a mim mesma para não levar tão a sério o julgamento de outros sobre minhas atitudes. Que deveria deixar essas preocupações para a vida adulta e aproveitar para brincar ainda mais com meus irmãos e primos na rua Barcelos e na casa em construção da minha tia Neire. Ambas foram palco das minhas melhores lembranças dessa época.
Se pudesse me visitar na minha adolescência, diria a mim mesma que eu não precisava querer ser igual às outras garotas, ter o que elas tinham. Que eu teria minha oportunidade para conquistar tudo o que desejava. E diria ainda que quando tivesse os recursos para isso, perceberia que isso não importaria mais. Eu teria aprendido que a gente não precisa de muito para ser feliz. Uma amizade sincera, o cuidado dos familiares, saúde... tudo isso é mais importante. Diria também a mim mesma para valorizar os meus avós, sentar para ouvir suas histórias (também eram minhas histórias), pois eles partiriam bem antes de terem a oportunidade de me contá-las.
À minha versão jovem, diria para não me preocupar com a faculdade, que curso fazer, que profissão seguir. Que tudo iria se ajustar ao seu tempo e era normal ter tantas dúvidas nessa época. Até mesmo considerar parar no meio do caminho... Avisaria a mim mesma sobre quais amizades me dedicar pois algumas, às quais eu dava tanto valor, não iriam sobreviver dali a alguns anos.
Porém, por mais tentador que seja uma situação como essa – voltar no tempo e consertar nossos erros – ela não contribuiria para o nosso crescimento. Apagar os erros e os equívocos, e nos afastarmos de pessoas que poderiam nos decepcionar, roubaria de nós nossas principais experiências. Aquelas que nos tornariam quem somos hoje.
Não dá para crescermos sem passar por dúvidas, dor e decepções. Juntamente com nossas melhores experiências, esses momentos nos moldam. Quando percebemos o que deveríamos ter feito e não fizemos, isso nos dá a oportunidade de não errar daqui para a frente. Podemos não ter a opção de consertar os erros do passado, mas temos o poder em nossas mãos para evitar que eles se repitam no futuro. Essa é a vida real.
Graciene Silva de Siqueira
Graciene Silva de Siqueira é professora do curso de jornalismo da Universidade Federal do Amazonas em Parintins desde 2009. Possui mestrado em Ciências da Comunicação (UFAM/Manaus) e doutorado em Letras (Mackenzie/SP). Trabalhou onze anos em redações de jornais como A Crítica, A Notícia, Diário do Amazonas e O Estado do Amazonas, nas funções de repórter, colunista e editora.
Apaixonou-se por filmes quando trabalhou em uma videolocadora nos anos 1980. Escreveu roteiro de curtas-metragens premiados no Amazonas, como Telefone sem fio, Além da vida e Sonhos, e outros exibidos em festivais, como Mormaço e Próximo ponto. Pesquisa e coordena projetos relacionados à Sétima Arte na Ufam. Em seus planos estão escrever o roteiro de um longa-metragem e um livro de crônicas.